quarta-feira, novembro 29

Desespero

Não me vem outra palavra à mente. Pura e simplesmente desespero. Sinto-me cada vez mais perdida. Não sei para onde me virar. Sinto que tudo me foge debaixo dos pés. Ponho tudo em causa. Sim, estou a falar de sonhos. Estou a falar de fazer tudo para os atingir. Sentir que não são alcançáveis... para nós, porque os outros! Ah! Os outros! Os outros tudo têm. Ou assumem que sim. Não sei porque raio hei-de ser assim. Um projecto inacabado. Porque não concretizo. Esqueço de quem sou, por dentro. Em prol de uma vida melhor. Ou talvez não. Talvez a minha essência seja esta. Escrevo em frente ao A. Pela primeira vez, escrevo com alguém a respirar o mesmo ar que eu. Talvez porque por palavras ditas não saia. Talvez. Talvez sinta que só tu percebas. Talvez escreva porque it´s the easier way. Mas fica sempre algo por dizer. Dizem que uma imagem vale mais de mil palavras. Ora, perspectiva: uma estrada, linha recta, altos e baixos sim, mas um só sentido. Páro, várias setas indicam futuros diferentes. Tipo jogo de computador. Nível 1, nível 2, nível 3. Simples dirás! Ok, escolhe-se o nível mais fácil se se quer com certezas chegar ao fim. Escolhe-se o nível 3 se acredita que se pode chegar ao fim. Visualizas? Ora, sempre tive a convicção de que chegaria ao fim, fosse qual fosse o nível escolhido. Sempre acreditei, não em Deuses, mas em mim e num destino que havia de chegar. Fui como um atleta em que todos apostam mas, «temos pena, tem de pagar o equipamento por si porque não há patrocínios!» Qualquer coisa deste género. Hoje, com 27 anos, e 8 de trabalho, de estudo e de preserverança, mesmo quando a esperança estava por um fio, desconfio que na estrada vou, quando tiver de ser, escolher o caminho mais fácil, o tal do nível 1. Viverei com isso? Não sei. Sinto-me em depressão clínica só de imaginar. Abdicar de mim para estar em mim! Surreal, não é? Partidas que a mente nos prega. Voltando ao atleta, que hoje mais do que prazer, sente necessidade de satisfazer o vício dos altos voos, todos sabemos que têm uma carreira temporalmente curta. Esgota-se o corpo, esgota-se a mente. Pois é por aí. Esgota-se a mente e a capacidade de fazer tudo ao mesmo tempo. Dorme menos, dirias. Trabalha à noite. Mas como? Como, se não tenho estrado para os meus saltos? Como se não tenho como tempo num só dia de levar 3 actividades profissionais em simultâneo? Passo a esclarecer: uma dá-me o pão, outra dar-me-á talvez algum pão um dia, outra dá-me um profundo prazer, e um dia dar-me-á penso o resto do meu pão até que «a morte nos separe». Ora, se não posso deixar de comer hoje, amanhã também preciso de encher a barriga e daqui a 20 anos, espero, terei de encher a minha e a de mais 1 ou 2 barrigudos. Mas, deixando estas coisas das imagens de lado, este é o meu desespero. Como lido com incertezas diárias, com a sensação de que o me dia útil não chega e de que não cuido de mim há tanto tempo... Tenho saudades de uns pôres-do-sol em S. Julião com uma amiga especial, que me ensinou poesia, que me ensinou parte do que sou (saudade de ti, Caracóis), saudades de vaguear sozinha, em profunda introspecção do que é a sociedade em mim, saudades de sentimentos de paixão, de sentimentos de arrebatamento, pelas músicas, pelos outros, pelo sol, pelo mar, por mim própria. Disseram-me há dias «Parabéns! Ficou entre as 20 melhores nos exames de aferição da Ordem dos Advogados - em mais de 400 pessoas que fizeram os ditos exames. Por isso foi chamada a esta entrevista de emprego». Sim?, disse eu. Sabem o que senti? Nada. Nada. Hoje não sinto nada. Apenas um profundo desalento. Perguntas-me, és feliz? Sou. Sou mais feliz do que antes. Porque chego a casa e tenho quem me espere, com um sorriso. Porque sei que tenho alguém que acredita em mim. Uma pessoa. Durante o meu crescimento, tive muitas pessoas que apostaram em mim, mas na hora de irem torcer para a bancada, nunca foram. Tinham afazeres, tinham desinteresse. Hoje tenho alguém na bancada. Mas também tenho a convicção profunda de que a bancada estará sempre meia vazia. Antes não o sabia. Agora sei. Isso, meu caro, é a causa da tristeza mais profunda que já se abateu alguma vez em mim. Estarei a falar do meu pai? Também. Dentro da sua alienação do mundo e das pessoas, de carne e osso, se eu o levasse, ele estava. Com os olhos a brilhar por mim. Sinto tanta falta disso. A quem ligar a dizer: Fiquei entre as 20 melhores! e ouvir um: E então? Não fizeste mais do que a tua obrigação. Mais fácil seria se ele simplesmente não estivesse. Mais fácil seria. Mas, ainda que ele cause a gigantesca fatia do meu desespero interior, a puta da sociedade encarrega-se de causar a restante. Que vida esta. Mais não-sei-quantos mil licenciados no desemprego este ano. Ouvi hoje na rádio. Mas será que o facto de a pessoa ter um juízo crítico não ajuda a arranjar um lugar onde começar a desenvolver um futuro? O A. diz que tenho habilitações a mais. Por favor! Nem quero pensar que ele pode ter razão. E depois, obrigam-me a fazer tudo ao mesmo tempo. Com obrigações pago direitos. Com direitos arranjo mais obrigações. E como conjugar tudo em 24h? Não conjugo. Trato das obrigações e com sorte de 1 ou 2 direitos. Um dia, serão só obrigações! Será? Não quero.
Fico-me, já escrevi demais. Mas as palavras tecladas são assim, como as cerejas...

4 comentários:

disse...

Nunca te recrimines por sonhar ou ambicionar, nunca penses que não mereces ou não consegues, se não é isso que a consciência te diz. Já tantos sofrem por causa disso, e sem sequer se apercebem... E quando te sentires sem rumo, lembra-te sempre das palavras de um grande John, o Lennon: "Life is what happens while you are busy making other plans." Beijocas.

Bernardo Santa Clara Gomes disse...

Já te vi para cima, já te vi para baixo. Já te vi para a esquerda e já te vi para a direita. E ainda aqui estás.
Advogada formada, a fazer um mestrado, com emprego (não digo trabalho qur fica mal), que queres mais minha priminha pequenina?
Com a tua idade, tomara muitos de nós termos conseguido um pouco do que tu conseguiste.
Os teus sonhos parecem-te longe? Então é porque são bons.
E tu és muito boa a realizar sonhos bons....
Quanto à meia bancada, sabes que temos sempre alguém que não percebe que nos prenche meia bancada, para não dizer toda uma!
Beijos!
p.s. Nos primeiros 20 entre 400? YES! Parabens! I'm very proud!

Bernardo Santa Clara Gomes disse...

Já te vi para cima, já te vi para baixo. Já te vi para a esquerda e já te vi para a direita. E ainda aqui estás.
Advogada formada, a fazer um mestrado, com emprego (não digo trabalho qur fica mal), que queres mais minha priminha pequenina?
Com a tua idade, tomara muitos de nós termos conseguido um pouco do que tu conseguiste.
Os teus sonhos parecem-te longe? Então é porque são bons.
E tu és muito boa a realizar sonhos bons....
Quanto à meia bancada, sabes que temos sempre alguém que não percebe que nos prenche meia bancada, para não dizer toda uma!
Beijos!
p.s. Nos primeiros 20 entre 400? YES! Parabens! I'm very proud!

Anónimo disse...

a poesia é a nossa essência, temos de voar pelos nossos caminhos, encontrar o nosso interior, gritar, sufocar, correr dentro de nós. Envolvidos por tempestades, calafrios, desespero encontramos e tocamos na linha do horizonte e sentimos a nossa mente a desistir, a desfalecer... mas sem nos apercebermos alguém, como se um anjo fosse segura-nos, abraça-nos e disparamos novamente para aquilo que somos... a nossa essência, e essa já descobriste naquele dia que olhas-te para dentro de ti... lembraste? Não te assustes com a linha do horizonte e encontra a tua estrofe que vai completando a poesia da tua viagem... saudades do pôr-do-sol em S. Julião...